PASSO 1: Criação e adaptação do guião à plataforma
Para começar, será necessário escolher o tema a representar. Este será expresso numa estória, que será a base da montagem artística digital. Pode desenvolver o seu próprio texto dramático ou optar por um texto já existente, tendo este de ser adaptado ao contexto digital específico no qual a performance será realizada.
No caso de se aventurar na escrita de um novo texto, pode considerar algumas perguntas de orientação iniciais, tais como: O que gostaria de dizer? Que temas ou problemas considero interessantes? Porque é que é importante representar este tema em palco? A quem se dirige? Disponho de referências ao tema (estéticas, artísticas, jornalísticas, etc.)?
Da mesma forma, existem várias metodologias para a criação de um novo texto dramático ou guião. Possivelmente, a mais comum é o paradigma da estrutura dramática, apresentada por Syd Field e composta por três atos:
Primeiro ato: Apresentação
Introdução à estória e às personagens. Também expõe um primeiro «incidente» que irá despoletar os eventos seguintes da peça.
Segundo ato: Confrontação
Confronta-se o/a protagonista ou o/a herói/heroína da estória com os obstáculos que o/a impedirão de resolver o conflito, mas, no final do ato, uma mudança na estória vai tornar o resultado visível, introduzindo o último ato.
Terceiro ato: Resolução
Este ato apresenta o clímax da peça, mas também o desfecho e o que acontece às personagens em seguida.
Podem ser utilizadas outras metodologias de produção de textos que se aproximem mais de experiências práticas e pessoais, tais como a criação coletiva, a improvisação, a narração, entre outras. Por outro lado, é possível trabalhar com um guião ou texto dramático existente. Para selecionar o texto com o qual irá trabalhar, pode começar por responder às perguntas sugeridas anteriormente.
Quer trabalhe com um guião já preparado ou com um texto novo, é necessário passar por um processo adaptativo para ajustar o guião à plataforma digital selecionada. Este ponto é fundamental para a criação de teatro digital nativo, uma vez que irá distinguir uma performance criada digitalmente da adaptação de uma performance ou produto artístico realizado num contexto digital.
Tablet, telemóvel ou computador
Ferramenta necessária para pesquisar e organizar informação
Textos dramáticos
Podem servir de inspiração ou ser utilizados como a base da construção da performance
Documentos ou fontes de informação
Material que irá alimentar e tornar a estória coerente
Referências
Material que irá servir de exemplo ou inspiração para a construção do novo produto digital
Para além das competências transversais referidas acima, necessárias para esta etapa, as seguintes competências são integradas e trabalhadas neste passo:
Pesquisa:
Competência relevante para este passo devido à importância da capacidade de pesquisar informação, organizá-la e utilizá-la de forma mais eficiente. Para estimular o trabalho de equipa, recomenda-se que esta competência seja desenvolvida envolvendo todos os participantes na pesquisa de informação e ideias sobre o teatro digital e de uma possível base conceptual para criar ou adaptar o guião.
Autonomia e iniciativa:
Esta capacidade está relacionada com a vontade de passar à ação e tomar decisões sem ajuda ou apoio externo. Também se refere à adoção de uma atitude proativa. Neste primeiro passo da criação de uma peça de teatro digital, os formadores e as formadoras podem estimular a iniciativa e a autonomia dos e das participantes através do brainstorming, bem como a iniciativa mostrada em procurar informação e em partilhar experiências pessoais para a criação do guião.
Flexibilidade e adaptação à mudança:
Esta competência é especialmente necessária para este processo, o qual explora metodologias novas e inovadoras. Os formadores e as formadoras podem desenvolver esta competência junto dos e das participantes ao experimentarem várias estratégias no momento de testar o guião na plataforma digital escolhida ou ao convidarem os e as participantes a trabalharem nas ideias e textos propostos por outras pessoas para debaterem pontos de vista e saírem da sua zona de conforto.
Criação do guião para plataformas digitais
Para eventuais esclarecimentos sobre este passo, sugerimos a seguinte atividade:
Idealmente, 2–5 pessoas. No caso de o número de participantes ser maior, a atividade pode ser facilitada em pequenos grupos (de 2–5 pessoas) e o debate posterior ser realizado com a totalidade de participantes.
- Identificar um tema para a criação de um guião de teatro digital;
- Criar e desenvolver um guião básico para ser utilizado em plataformas digitais;
- Incorporar as ferramentas e recursos das plataformas digitais no guião.
O tempo necessário para criar o guião dependerá do tempo que pretender despender. O mesmo poderá ser criado num dia ou em várias semanas consoante o tempo disponível. O tempo mínimo necessário são 2-3 horas.
- Computador, idealmente (ou, pelo menos, um telemóvel ou tablet);
- Ligação à Internet;
- Plataforma digital para videochamadas: Meet, Zoom, WhatsApp ou outra;
- Plataforma digital para criar e escrever documentos partilhados visíveis para todos: Google Drive, Jamboard ou outra.
A equipa prepara e seleciona uma ideia e desenvolve-a numa estória a ser adaptada a uma plataforma digital. Para esta atividade, recomendamos que seja feita uma pesquisa prévia sobre a utilização de plataformas digitais. Também é aconselhável manter um registo (tal como gravar a sessão ou redigir uma ata) como parte da sistematização do processo criativo. Para melhorar a comunicação, o grupo pode reunir-se numa plataforma que permita a realização de videochamadas e a partilha de ecrãs.
Brainstorming:
No caso da criação coletiva de um guião, pode utilizar o Jamboard, ou outra ferramenta semelhante, como quadro branco interativo para fazer algo mais criativo e dinâmico. Este tipo de plataforma pode ser utilizada para criar mapas, partilhar imagens, entre outras coisas.
Dica: Pode fazer as seguintes perguntas ao grupo para quebrar o gelo:
Que assuntos acham interessantes?
Que assuntos pretendem abordar?
De que estilo ou género de teatro gostam?
Dica: Para este passo, pode ser útil pedir aos e às participantes que partilhem referências sobre os seus interesses, tais como: peças, filmes, histórias e experiências pessoais, notícias, fotografias, áudios, histórias nas redes sociais, entre outras.
Exemplo: Na sessão de brainstorming, um membro propõe a utilização de uma notícia sobre um caso real sobre um conflito entre um grupo de vizinhos e vizinhas. O grupo decide utilizar esta notícia como base para o seu trabalho.
Para aprofundar o processo criativo e desenvolver a ideia, pode fazer as seguintes perguntas:
Os temas ou ideias partilhados podem ser desenvolvidos numa plataforma digital? De que forma?
Dica: Se os e as participantes tiverem dificuldades em responder a esta pergunta, primeiro, peça às pessoas que, à vez, digam que plataformas digitais utilizam e para que finalidade e, talvez, partilhem uma anedota relacionada com essa plataforma.
Exemplo: O grupo discute a forma como adaptar as notícias selecionadas a uma plataforma; as possíveis ideias a discutir são: pode ser uma reunião no Zoom ou um grupo para a vizinhança no Facebook ou no WhatsApp.
Observação: Para esta etapa da atividade, recomendamos impor um tempo limite porque a mesma pode durar indefinidamente se não for monitorizada.
Definir o espaço cénico digital:
Nesta etapa irá decidir onde é que a ação terá lugar. No caso do teatro digital, a plataforma torna-se o palco.
Pode fazê-lo respondendo à pergunta:
Qual é a plataforma digital mais apropriada para desenvolver o conflito ou a ideia?
Dica: Ter em conta o objeto de estudo da pesquisa sobre plataformas digitais irá facilitar esta decisão.
Exemplo: O grupo define certos critérios para a seleção da plataforma, decide que a estória deverá ocorrer num formato de grupo e não num formato individual. A audiência deverá ser capaz de interagir e a plataforma deverá ser de fácil acesso. Chegam a acordo para utilizar o WhatsApp, considerando esta plataforma como a mais adequada para refletir a ideia da estória (conflito de grupo, muitas opiniões diferentes, possibilidade de envolver e interagir com a audiência).
Neste caso, podem ser pedidos mais detalhes à audiência para definir melhor o contexto:
A que grupos do WhatsApp pertencem e quais são os conflitos comuns ou particulares que se desenvolvem na plataforma?
Desenvolvimento do enredo:
Este passo foca-se nas possíveis formas de desenvolvimento do conflito, do contexto e das personagens de modo a apoiar o enredo.
O ponto de partida é a resposta à pergunta:
Qual é o principal conflito que quero desenvolver na peça?
Dica: Dependendo do grupo e da participação neste processo, para responder a esta pergunta, o facilitador ou a facilitadora pode oferecer algumas diretrizes ou dar espaço aos e às participantes até que cheguem a acordo.
Definir marcos e a criação de cenas:
Selecionar certos marcos na estória pode ser um ponto de partida para desenvolver adicionalmente as cenas e dar lugar à escrita dos diálogos, incorporando os códigos e os recursos da plataforma digital selecionada. Para manter uma ordem na dramaturgia, pode ser útil separá-la por situações e cenas. Se optar por lhe atribuir uma ordem aristotélica, pode separá-la por atos:
Primeiro ato: Introdução ao tema e apresentação das personagens;
Segundo ato: Desenvolvimento do conflito;
Terceiro ato: Clímax e desfecho.
Observação: Para criar os diálogos de cada cena, espera-se que os e as participantes aprofundem a estória e forneçam as informações necessárias sobre cada personagem ou situação.
Exemplo: O grupo identifica como problema principal o facto de o conflito na vizinhança se dever a problemas de coexistência e a atitudes racistas da parte de um dos vizinhos, que integrou recentemente a comunidade.
Algumas perguntas de orientação podem ser:
O que aconteceu antes deste evento? Que relações existem entre os vários membros da comunidade? Onde está localizado o edifício?
Estes elementos irão ajudar a definir melhor o contexto do guião e as personagens.
Dica: Na escrita de guiões recomenda-se:
- incluir anotações que detalhem se se trata de uma mensagem de áudio ou escrita ou de um vídeo/fotografia. Indique sempre que for utilizado um sticker ou emoji, entre outros recursos,
- identificar elementos da plataforma em si que possam permitir criar mais tensão ou fornecer mais informação à cena, tais como eliminar mensagens, sair do grupo, etc. Estas ações podem substituir movimentos ou ações subtis do teatro «tradicional» que não podem ser reproduzidas da mesma forma no contexto digital.
Construir os perfis das personagens:
Defina a informação necessária para a criação das personagens: nomes, idade, género, origem, profissão, crenças, entre outros elementos relevantes.
Algumas perguntas úteis são:
Qual é o papel da personagem?
Qual é o objetivo da personagem nesta estória?
Dica: Deve construir-se o perfil da personagem tendo em consideração os recursos disponíveis na plataforma de modo a definir melhor as características da mesma.
Exemplo: O grupo identificou certas personagens principais na estória baseada em notícias. Na estória baseada em notícias é realizada uma entrevista a uma administradora e um/a vizinho/a do edifício. O grupo seleciona este/a vizinho/a para criar uma personagem.
Neste caso, podemos fazer as seguintes perguntas para obter ou criar a informação em falta:
Qual é a sua função na comunidade? Ela é administradora da comunidade. Assim, na plataforma ela será a administradora do grupo do WhatsApp para a vizinhança.
Dica: No caso do WhatsApp, estes elementos são muito úteis para apresentar as personagens:
Fotografias de perfil: Como imagina ser a personagem? Pode utilizar fotografias do elenco ou outras opções;
Estado do WhatsApp da personagem no momento atual;
Tipo de comunicação: Como é que a personagem escreve? Que códigos e recursos da plataforma utiliza? Que estética de GIF, emoticons e stickers utiliza? Envia áudios, vídeos, fotografias?
Edição:
Esta informação pode mudar ao longo dos ensaios, especialmente quando testada diretamente na plataforma digital selecionada. Terá de considerar rever o guião para:
- editar cenas que não sejam claras,
- eliminar cenas que não sejam suficientemente claras ou que não oferecem muita informação,
- escrever cenas que estejam em falta.
Participação da audiência:
Este ponto é opcional. Pode considerar várias opções ao nível da participação, tendo em consideração a plataforma digital selecionada. Se optar pela participação da audiência, é importante escrever a mesma no guião.
Durante e no final da atividade, é importante sublinhar que o processo de criação do guião será modificado de modo a adaptá-lo à plataforma escolhida (ou a escolher). Independentemente do método utilizado para a criação do guião, no teatro digital, é essencial relacionar o guião com as linguagens e os recursos disponíveis na plataforma digital selecionada.
Para concluir a atividade, podem ser feitas algumas perguntas, tais como:
O grupo está satisfeito com o que criou?
O conflito ou conflitos que o grupo pretende desenvolver estão claros no guião?
A forma como o guião será adaptado e como as ferramentas e os recursos da plataforma digital selecionada serão incorporados é clara?
Existem vários métodos de criação de guiões, tais como a improvisação, a narração, entre outras. Se optar por trabalhar com um guião já existente, é necessário estudá-lo e adaptá-lo para ser utilizado na plataforma digital.
Tenha em atenção que os timings da criação do guião podem ser prolongados consoante a calendarização e as datas de produção e direção, bem como a duração pretendida da performance.
Ferramentas de trabalho simultâneo online:
Recomendamos que o passo seguinte seja trabalhado em paralelo com o primeiro passo, uma vez que a criação de um guião ou a adaptação de um texto dramático irá depender grandemente da plataforma digital escolhida como «palco», ou seja, o local em que a peça será apresentada. Assim, juntamente com a definição e a criação do guião, é necessário fazer uma pesquisa sobre as plataformas digitais conforme detalhado abaixo.